BENEDITENSE INÊS SILVA LANÇOU LIVRO SOBRE A EN2
Por João Maurício
Sobre Inês Silva sei bem pouco. Foi aluna da antiga Escola Preparatória da Benedita, quando eu lá trabalhei – numa segunda passagem – no início dos anos oitenta do século passado. Foi professora na Escola Superior de Educação de Santarém e é vereadora da Câmara de Alcobaça. Escreve muito bem, realidade que valorizo.
Em 2008, publicou “A Casa das Heras”, um livro cheio de ritmo, rico no seu conteúdo e, claro, é um livro que se lê com sofreguidão.
A autora acaba, agora, de lançar a obra “Daqui, Deste Lugar – Crónica de uma Viagem”. A narrativa resulta do percurso feito pela narradora entre Chaves e Faro, pele mítica Estrada Nacional nº 2. Estamos perante uma prosa muito bem elaborada sobre um tema que me diz muito. Tenho familiares que vivem muito próximos, junto à EN2, algures no concelho de Abrantes. Por isso, passo lá muitas vezes. O livro mostra-nos uma estrada com “cheiros, cores, montes e vales”. Estamos perante uma reflexão sobre o Portugal profundo.
Este trabalho é muito mais do que uma simples crónica de viagens. É uma fotografia sobre o interior do país.
Criada em 1945, a estrada “rasga” Portugal de Norte a Sul, e passa por concelhos tão diferentes como Chaves, Lamego, Mortágua, Lousã, Abrantes, Coruche, Alcácer do Sal, Loulé e Faro, só para citar alguns.
Atravessa 11 rios e percorre 11 serras. Segundo alguns estudiosos da matéria, a construção da EN2 foi um falhanço do Estado Novo, porque a mesma passou longe dos principais centros urbanos do interior. Parte do seu traçado foi, mais tarde, desclassificada, passando a estradas regionais e, até, municipais. Apenas 180 kms foram mantidos como estrada nacional. Só o troço entre Almodôvar e São Brás de Alportel foi renovado e classificado como Estrada Património.
Em 2016, foi criada a Associação de Municípios da Rota da Estrada Nacional 2 (33 municípios) que tem como objetivo dinamizar o turismo ao longo do itinerário. Viajar na EN2 é, de certo modo, regressar ao passado. No fundo, um tempo em que as autoestradas, as vias rápidas, os itinerários
completares e principais eram uma miragem. Era o tempo da Junta Autónoma das Estradas, dos cantoneiros, dos polícias sinaleiros.
A estrada EN2 é a via mais extensa de Portugal e a única na Europa que atravessa um país em toda a sua longitude. No mundo, há apenas mais duas do mesmo tipo: uma nos Estados Unidos e outra na Argentina.
A autora aproveita a viagem e fala, também, da nossa região, nomeadamente, do IC2, ex EN1.
Inês Silva tem uma escrita requintada, que não é fácil de digerir.
Do seu livro em questão, escolhi as páginas da 35 à 40, onde se refere à bela Chaves. E, faço-o, porque passei grandes temporadas na vizinha região do Barroso, por razões familiares. Afirma, a certa altura, que “Acordar em Chaves trouxe-me a sensação de entrar num lugar anterior a tudo o que conheço”. Refere-se, também, ao coração do distrito de Leiria como “um território de maravilhosos contrastes”. E depois, no fim da viagem, já em Faro, onde “ o marco branco tinha todos os vestígios da passagem dos anos”.
São quase cem páginas que fazem um retrato do interior do país, das suas paisagens, as histórias e as suas gentes.
Inês Silva como que brinca com as palavras, usando o lado sublime e requintado das mesmas, tornando-as misteriosas, recorrendo a adjetivações com mestria e brilho. E depois, partindo do presente, mostra-nos quadros da infância que o tempo não apagou. A sua prosa é, ainda, uma mescla de dados históricos, relatos do dia a dia, referência a escritores, a detalhes banais, como as letras pintadas no carro dos bombeiros de Castro Daire (pág. 53).
Um livro rico, por tudo isto!
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