HISTÓRIA DOS DOIS CASINOS INSULARES PORTUGUESES
Entre 1893 e 1906, presidindo a três governos, Hintze Ribeiro dirigiu os destinos da Nação Portuguesa. Nascido em Ponta Delgada, nos Açores em 1849, Hintze Ribeiro exerceu uma forte ação na repressão ao jogo (então clandestino) de fortuna ou azar que se praticava em Portugal. O que terá certamente contribuído para desgastar a sua imagem política, pois as sucessivas tentativas repressivas ao jogo resultavam invariavelmente fracassadas. Por todo o País se jogava clandestinamente, com conhecimento de todos. As casas de jogo eram fechadas num dia pela polícia mais logo no dia seguinte (ou mesmo no próprio dia) reabriam.
Na cidade do Funchal, na ilha da Madeira, aconteceu que em 1903 que sob a capa da construção de Sanatórios, se pretendia afinal construir e explorar autênticos casinos. O negócio teve de ser cancelado, o que obrigou o Estado português, por ter rescindido o contrato de concessão, a uma pesada indemnização ao concessionário, o príncipe alemão Federico Carlos de Hohenlohe. Os projetados Sanatórios (que afinal esconderiam estabelecimentos luxuosos para a prática de jogos de fortuna ou azar), a construir sobre as Quintas Vigia, Pavão e Bianchi, no princípio do século XX, desenharam afinal, o futuro de uma zona da cidade do Funchal, a qual ficaria ligada ao Turismo e ao Jogo. Até aos dias de hoje.
CASINO DOS AÇORES
A possibilidade de se vir a explorar jogo nos Açores ficou logo prevista em 1927, na primeira lei de jogo em Portugal. Porém, e diferentemente do que sucedeu com a Madeira, não foi criada nesse diploma a respetiva zona de jogo. O casino açoriano Terra Nostra funcionou (legalmente) a partir 1937, em regime especial de concessão. Dois anos depois, eclode a II Guerra Mundial e a sua atividade fica suspensa.
No livro “Na Toca do Lobo”, de Larry Loftis, diz nas páginas 45 e 46: “Ao longo de 1940 e 1941, Roosevelt e Hitler travaram uma guerra silenciosa relativa a Portugal. Enquanto que Lisboa era um porto útil em rotas chave por via marítima, o império colonial português (que compreendia um território vinte e cinco vezes maior do que a metrópole) tinha uma importância militar muito maior. Desde as ilhas africanas de Cabo Verde a Macau, junto à China, passando por Goa, na Índia, os territórios portugueses eram alvos tentadores. A jóia da coroa, porém, era o arquipélago dos Açores. Se os Aliados ou poderes do Eixo tomassem os Açores, temia Salazar, as ilhas seriam rapidamente transformadas numa base naval e submarina. Era a rainha do xadrez militar do Atlântico. Num discurso proferido em 27 de maio de 1940, o presidente Roosevelt anunciou -sobretudo para que chegasse aos ouvidos de Hitler- que os Açores tinham tamanha importância estratégica que os Estados Unidos não podiam permitir que caíssem em mãos hostis”.
Passados 80 anos (1937-2017), assistimos à abertura de um novo casino nos Açores, na ilha de São Miguel, em Ponta Delgada. Já inserido numa zona de jogo, criada em 1989, e concessionado à sociedade Romanti Casino Azores, S.A., com autorização legal para a exploração de jogos de fortuna ou azar, a qual é válida por 30 anos. Na ilha Terceira, uma das nove ilhas do arquipélago, encontra-se também em exploração desde 2016, uma sala de máquinas automáticas.
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CASINO DA MADEIRA
Na capital, cidade do Funchal, onde se situa o casino, concentra-se mais de um terço da população da ilha. Dada a sua importância turística, o legislador de 1927 concedeu-lhe logo a distinção de ‘Zona de Jogo Permanente’ da Ilha da Madeira, tal como o fez relativamente ao Estoril. Em 1928, foi celebrado entre o Governo e a Companhia de Turismo da Madeira um contrato para a exploração do jogo de fortuna ou azar na Ilha da Madeira, cidade do Funchal, pelo período de 30 anos com início em 1928. Porém, e porque à 1ª concessionária, a Companhia de Turismo da Madeira, não lhe foi possível continuar a explorar o casino nos termos a que se obrigara contratualmente, aquele encerrou em finais de 1932. Em 7 de fevereiro de 1936 foi assinado o contrato de exploração de jogo com a Empresa de Turismo da Madeira. Não obstante o Governo ter prorrogado o contrato à Empresa de Turismo da Madeira (o qual terminava em 31 de março de 1937), a verdade é que o debate iniciado logo em março de 1937, referente aos encargos que recaiam sobre a empresa concessionária (esta protestava por uma diferenciação de taxas e encargos nos períodos de Verão e no Inverno), levou a que, em 1939, ficasse uma suspensa da concessão da exploração de jogo na Madeira, também e naturalmente em resultado do deflagrar da Segunda Guerra Mundial.
Só em 1958, foi novamente atribuída uma concessão de jogo no Funchal. Contudo, o início da exploração ficava dependente da conclusão de obras de remodelação do casino, o qual era propriedade do Estado. Em 15 de julho de 1964, era finalmente assinado o contrato de concessão da zona permanente do Funchal, com a ITI, Sociedade de Investimentos Turísticos da Ilha da Madeira, S.A.R.L., empresa que, em consequência, recebeu o edifício do casino e a Quinta da Vigia. E, finalmente, em 1964, o Casino da Madeira reabria as suas portas ao público, decorridos 25 anos sobre o termo da última exploração em 1939. Em 3 de outubro de 1976 era inaugurado o Casino Park Hotel, um projeto arquitetónico de Óscar Niemeyer e de Viana de Lima, e com decoração de Daciano Costa. O “Novo Casino da Madeira” foi inaugurado em 1979, mantendo-se ainda hoje em funcionamento, após mais de quarenta anos de atividade. O cassino está localizado exatamente na zona projetada em 1903 pelo príncipe Federico Carlos de Hohenlohe para os Sanatórios, e condenada ao fracasso, tanto pela postura irredutível dos empresários ingleses como pelos preconceitos existentes relativamente ao jogo. Condenou-se o “casino” que o projeto dos Sanatórios em 1903 escondia, mas afinal, um casino veio a construir-se na zona projetada pelo Príncipe Hohenlohe.
Artigo de José Eduardo Deus - Inspetor de Jogos
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