RIO MAIOR E HUMBERTO DELGADO
O General venceu as Eleições Presidenciais em Rio Maior a 8 de junho de 1958
Tinha oito anos e recordo-me como se fosse hoje. Algures, num muro branco, na Benedita, em letras grandes e mal desenhadas, estava escrito “Vota Humberto Delgado”. A tinta era preta e brilhante. Algum oposicionista, pela calada da noite fez aquela pintura. Havia medo e, por isso, ninguém falava do assunto. A frase tinha uma carga ideológica enorme, era algo de subversivo. Só muito mais tarde, percebi o valor simbólico daquelas palavras. Infelizmente, há muito poucos dados sobre as eleições presidenciais desse ano, em Rio Maior. O general fez campanha em Santarém e nas Caldas da Rainha, mas por cá não chegou a passar. Pela primeira vez, a oposição teve acesso aos cadernos eleitorais.
José Pulquério, em 1998, contou-me que “quando os copiei no Governo Civil de Santarém foi numa sala onde não havia secretárias nem cadeiras. Uma verdadeira humilhação”! Foi uma entrevista que publiquei no Região de Rio Maior.
Nessa conversa, Pulquério disse-me ainda que “pedia desculpa de se esquecer de alguns nomes dos que aqui, em Rio Maior, apoiavam Humberto Delgado, mas ainda me recordo de João Fróis de Figueiredo, Alberto Goucha e do Dr. Aguiar”. Foi o mesmo oposicionista que nos lembrou que, em S. Sebastião (que na época pertencia à freguesia das Fráguas), a mesa era constituída por cinco elementos afetos a Américo Tomás. A verdade é que o almirante só teve quatro votos naquela mesa. Pulquério foi delegado da oposição no Outeiro da Cortiçada e Mário Goucha desempenhou iguais funções em Rio Maior. Muito, justamente, este concelho atribuiu o seu nome a uma rua a este ribatejano de mérito.
“Todos nós, cidadãos pacíficos de uma candidatura pacífica, queremos pacificamente conquistar a paz. Mas os esbirros do governo, como têm visto, andam a chamar-nos subversivos nos jornais e a tratar-nos na via pública como malfeitores. Ninguém sabe, portanto, onde isto pode ir ter. Há uma coisa, porém, que quero jurar aqui. Eu estou pronto a morrer pela liberdade!” Humberto Delgado, discurso de Chaves, 22 de Maio de 1958.
Humberto Delgado foi um percursor do 25 de Abril. Frontal, generoso, pagou com a vida a sua ousadia.
No jornal “O Riomaiorense”, um “iluminado” afeto ao sistema vigente, escrevera anteriormente que no concelho não havia nenhum “movimento da oposição”. Talvez, por isso, o mesmo jornal não publicou os resultados eleitorais. De facto, o sectarismo era enorme.
Resultados eleitorais no concelho de Rio Maior: Humberto Delgado – 1.022 votos. Américo Tomás – 974 votos.
Votação concelhia alcançada por Humberto Delgado no distrito de Santarém, seguindo a ordem de maior percentagem para o que conseguiu menor percentagem:
Alpiarça foi onde Delgado teve maior percentagem de votos e o Sardoal foi onde a percentagem foi menor. Rio Maior ficou num honroso 6º lugar, no total de 21 concelhos.
1 -Alpiarça; 2 – Almeirim; 3 – Alcanena; 4 – Cartaxo; 5 – Santarém; 6 – Rio Maior; 7 – Chamusca; 8 – Salvaterra de Magos; 9 – Abrantes; 10 – Vila Nova da Barquinha; 11 – Tomar; 12 – Torres Novas; 13 – Golegã; 14 – Coruche; 15 – Benavente; 16 – Constância; 17 – Vila Nova de Ourém; 1 8 – Entroncamento; 19 – Ferreira do Zêzere; 20 – Mação; 21 – Sardoal.
O General teve uma forte ligação à nossa região. Nasceu no concelho de Torres Novas e passou longas temporadas na Cela, concelho de Alcobaça, de onde era natural a esposa.
Notas finais – sempre tive uma grande admiração por Humberto Delgado. Defeitos também os tinha, mas era “Senhor” de uma qualidade rara: uma coragem enorme. Essa caraterística é algo que está longe de ser uma virtude da maioria esmagadora dos nossos políticos. Infelizmente! E tê-la nos tempos da Pide era atributo que devemos enaltecer! Sempre!
Não é por acaso que ficou conhecido como sendo “O general sem medo”. Maior elogio não poderia ter tido!
Por João Maurício
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